segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Segunda-feira, 27 de setembro de 2010 - O Husky

Sai tarde do trabalho. Tarde quero dizer madrugada. Ao invés de pegar um ônibus para chegar em casa, optei por ir a pé mesmo. Meu dia havia sido bom: bom do tipo que traz a sensação de que nada ruim vai acontecer por um tempo; logo eu não tinha nada a temer.

Não estava frio nem quente. Havia um vento forte mas que não era gelado. A rua estava deserta, iluminada apenas pela luz dos prédios e casas de pessoas sem sono perdendo minutos das suas vidas assistindo televisão, falando ao telefone, cozinhando - ou quem sabe até transando. De vez em quando podia-se ver um morcego voando entre as árvores, e voava tão baixo que dava a impressão de que pousaria na minha cabeça.

O céu estava carente de estrelas. Embora fosse possível distinguir uma ou outra, não dava para ver as constelações. O único vestígio da lua era o brilho dela que tentava superar a densidade das nuvens que cobriam o céu, dando a ele um tom alaranjado, sobrenatural. Havia também um pouco de neblina que dificultava enxergar o topo dos prédios ou o fim da rua.

Era o cenário perfeito para um caso sombrio de Sherlock Holmes.
Ou, o momento ideal para que um lobisomen aparecesse de tocaia.

Minha mente começou a imaginar muitas coisas e situações que uma rua de aspecto sombrio e clima propicio poderia proporcionar. Eu estava tão perdida nas minhas idéias que nem percebi estar sendo seguida. Foi apenas quando eu estava chegando no prédio que resolvi olhar ao meu redor para atravessar a rua que eu o vi atrás de mim.

Ele era enorme. Parecia ser maior que um lobo. Seu pêlo era meio preto e acinzentado, e lindo, muito bem cuidado. Seus olhos brilhavam e transmitiam carinho, segurança. Sua expressão era séria, como se me repreendesse por andar sozinha e tão distraida tarde da noite. Era o maior e mais assustador husky siberiano que eu já tinha visto. Eu não me lembrava de algum dos meus vizinhos - tanto no prédio como nas casas ao redor - possuir um husky. E ele não tinha coleira ou identificação alguma. Fiquei muito tentada a me aproximar dele e levá-lo para casa, mas ao mesmo tempo que me atraia, ele me afastava. Ao mesmo tempo que ele parecia querer ficar perto de mim, ele queria me observar longe.

Eu não percebi um grupo de rapazes embriagados se aproximando de nós. O husky os sentiu antes de mim, e como que me alertando começou a rosnar para mim e a andar na minha direção apontando o meu prédio com o focinho. Chegamos na portaria, eu entrei e o husky se virou e foi embora. Não houve tempo para fazer um carinho de agradecimento sequer. O caminho todo, da portaria até o meu apartamento, eu não tirava o husky da minha cabeça. Fiquei imaginando de onde ele veio, e para onde ele estaria indo, e por que ele tinha cismado comigo.

Deitada na cama, com Morfeu forçando meu sono, a imagem do husky veio na minha cabeça tão nitida como se ele estivesse no quarto comigo. Então tudo fez sentido e um calafrio percorreu o meu corpo pois junto com a imagem do husky, veio a imagem do Caim.

Assim como os de Caim, os olhos do husky eram azuis. E possuiam um brilho que eu só tinha visto nos olhos do próprio Caim.

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